Quando falamos sobre proteção contra quedas, a maioria das pessoas imagina cintos, talabartes e linhas de vida. Porém, o verdadeiro ponto crítico é entender a força gerada sobre o corpo do trabalhador no momento da retenção da queda — a chamada Força Máxima de Impacto.
Normas como a NR-35, NR-06, NBR 16325, NBR 15837, ANSI Z359 e diretrizes da OSHA deixam claro:
Um sistema de proteção só é eficaz se mantiver a força transmitida ao trabalhador abaixo dos limites seguros, geralmente até 6 kN.
Mas o que determina essa força?
Quais variáveis tornam uma queda mais ou menos severa?
A engenharia por trás desse fenômeno é complexa, e compreender cada fator é essencial para reduzir riscos e selecionar o sistema de segurança adequado.
A seguir, veja uma análise completa, técnica e baseada nas normas, sobre os quatro fatores que determinam a força em uma queda.
1. Massa: O peso do trabalhador e da carga transportada
A massa total do sistema humano é um dos elementos mais determinantes na energia gerada durante uma queda e, consequentemente, no valor final da força máxima aplicada sobre o corpo no momento da retenção.
A maioria dessas normas utiliza massa de ensaio entre 100 kg e 140 kg, sendo que sistemas devem suportar até 6 kN transmitidos ao corpo, respeitando limite fisiológico seguro.
Esse comportamento é explicado pela física clássica (segunda lei de Newton) e confirmado por todas as normas nacionais e internacionais de proteção contra quedas.
O que compõe a massa real em um cenário de trabalho em altura?
A massa total que influencia a força da queda é a soma de todos os elementos envolvidos:
-
Peso corporal do trabalhador
Indivíduos com maior massa corporal geram energia potencial mais alta.
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Peso dos EPIs
Cinturões, talabartes, conectores, ferramentas presas ao corpo, kits de resgate, rádios comunicadores etc.
-
Ferramentas acopladas ao cinturão
Cada ferramenta aumenta a energia absorvida pelo sistema na queda.
-
Mochilas, bolsas, kits técnicos
Instaladores, eletricistas, técnicos de telecom, manutenção industrial e equipes de montagem frequentemente carregam 5–15 kg adicionais.
-
Cargas acidentais em suspensão
Itens presos ao corpo que podem gerar solavancos adicionais no momento da queda.
Resumo crítico:
Não existe trabalhador “de 80 kg” na prática. Na engenharia, existe trabalhador com 100 kg a 140 kg incluindo equipamentos, conforme as normas exigem.
Por que esse fator aumenta tanto o risco? A explicação física
A força resultante da queda é descrita pela equação:
F = m x a
Onde:
- m = massa total
- a = aceleração resultante durante a queda (inclui aceleração da gravidade + aceleração adicional causada pela frenagem)
Quanto maior a massa:
- Maior energia potencial antes da queda
- Maior energia cinética durante a queda
- Maior energia que precisa ser dissipada no momento da retenção
- Maior força transferida ao corpo e à estrutura
E a dissipação só pode ocorrer:
- Pelo absorvedor de energia
- Pela deformação/alongamento controlado dos componentes
- Pela flecha do cabo (em linhas de vida horizontais)
- Pela deformação do talabarte
- Pelo sistema de ancoragem
Se a energia for maior do que o sistema consegue dissipar = falha catastrófica.
Riscos reais quando a massa não é considerada corretamente
-
Ruptura do EPI
Fitamentos, talabartes e cintos podem se romper quando submetidos a forças maiores do que aquelas para as quais foram projetados.
-
Falha do ponto de ancoragem
Ancoragens dimensionadas para cargas inadequadas podem:
- Deformar
- Desprender
- Destruir fixações químicas ou mecânicas
- Romper a estrutura base
-
Trava-quedas retrátil não acionar
Equipamentos projetados para faixas específicas de peso podem falhar ao travar se o usuário estiver fora da faixa de massa recomendada.
-
Força transmitida ao corpo acima de 6 kN
Acima de 6 kN, há risco significativo de:
- Danos à coluna
- Ruptura de órgãos internos
- Lesões por desaceleração abrupta
- Morte por impacto interno
-
Absorvedor de energia insuficiente
Absorvedores dimensionados para 100 kg podem não dissipar energia o suficiente para massas acima disso.
O que deve ser feito para evitar riscos: regras de engenharia
1. Sempre considerar o peso total (trabalhador + equipamentos)
Nunca usar peso corporal isolado.
2. Usar EPIs homologados para a faixa de peso REAL
Normas recomendam considerar cargas de 100 a 140 kg.
Para trabalhadores mais pesados, existem EPIs específicos “heavy duty”.
3. Recalcular DCF (Distância Livre de Queda)
Maior massa ⇒ maior estiramento do absorvedor ⇒ maior DCF necessária.
4. Selecionar sistema de ancoragem conforme NBR 16325-2
Considerar cargas dinâmicas e de impacto.
5. Utilizar ferramentas presas ao corpo com estrutura apropriada
Evita aumento súbito de massa em queda livre.
6. Observar limites do trava-quedas retrátil
Fabricantes especificam faixas de uso (ex.: 60–140 kg).
Resumo técnico
- A massa total é um dos fatores mais críticos para determinar a força da queda.
- Todas as normas (NBR, ANSI, OSHA, ISO) consideram 100–140 kg como referência realista.
- A massa influencia a energia potencial e cinética, aumentando a força no impacto.
- Não considerar o peso total do sistema pode causar falhas estruturais, ruptura de EPI e lesões fatais.
- A seleção do EPI e o cálculo de DCF devem sempre considerar a massa real do usuário + equipamentos.
2. Fator de Queda: a relação crítica entre altura de queda e comprimento do sistema
O Fator de Queda, previsto tanto nas normas ABNT quanto em referências internacionais como a ANSI Z359, é um dos fatores mais determinantes da severidade do impacto.
Ele é calculado pela fórmula:
Fator de Queda = Altura de Queda / Comprimento do Equipamento de Segurança
Veja nosso guia completo: https://atlassafe.com.br/fator-de-queda-guia-completo/
Exemplos simples:
- FQ 0: trabalhador acima do ponto de ancoragem, risco baixíssimo.
- FQ 1: trabalhador na mesma altura do ponto de ancoragem.
- FQ 2: trabalhador com ponto de ancoragem aos pés, cenário crítico.
Por que isso é decisivo?
Quanto maior o fator de queda:
- Maior será a aceleração da queda
- Maior a força de impacto
- Maior a necessidade de dissipação de energia
- Maior o risco de atingir obstáculos ou o solo
- Maior a exigência sobre o talabarte e pontos de ancoragem
Cenários com Fator de Queda ≥ 1 já são considerados perigosos e exigem soluções técnicas específicas, como:
- Talabarte com absorvedor de energia
- Ancoragem elevada
- Redução da distância livre de queda (DCF)
- Linhas de vida guiadas
- Trava-quedas retráteis (quando a geometria favorecer)
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3. Tipo de Material: Elasticidade, resistência e capacidade de dissipação
A resposta do sistema de proteção contra quedas durante um evento de queda está diretamente relacionada às propriedades físicas e mecânicas dos materiais que compõem cada parte do sistema: talabarte, absorvedor, cinturão, conectores, linha de vida, trava-quedas e ponto de ancoragem.
A NR-35, a NBR 16325, a ANSI Z359 e referências internacionais são unânimes:
O material utilizado em cada componente determina a capacidade do sistema de absorver energia, limitar a força no corpo e evitar falhas catastróficas.
Portanto, entender as características dos materiais não é detalhe técnico, é parte vital do PPCQ e da engenharia de quedas.
A seguir, veja como cada uma dessas propriedades influencia diretamente a segurança.
1. Elasticidade: quanto o material consegue se deformar antes de romper
A elasticidade é a capacidade do material de alongar-se durante o impacto da queda. Ela funciona como uma “zona de amortecimento”, reduzindo a força transmitida ao corpo do trabalhador.
Materiais comuns e seu comportamento:
- Fitas de poliéster → Altamente elásticas e utilizadas em talabartes, cintos e absorvedores.
- Cordas de nylon → Possuem elasticidade significativa, porém não são usadas isoladamente em quedas devido ao efeito chicote.
- Cintas de poliamida → Bom equilíbrio entre elasticidade e resistência.
Por que isso é importante?
Quanto maior a elasticidade controlada, menor o pico de força no impacto. Este conceito é reforçado pela norma, que exige que talabartes com absorvedor limitem a força máxima no corpo a ≤ 6 kN.
Elasticidade = dissipação de energia → proteção do corpo.
2. Resistência à tensão — Capacidade de suportar o pico de carga sem falhar
A resistência à tensão é a força que o material suporta antes de romper.
Normas como:
- NBR 15837 (cinturões)
- NBR 15836 (talabarte)
- NBR 14626 (retrátil)
exigem que os componentes suportem cargas que variam de 15 kN a 22 kN antes de ruptura em ensaio estático.
Por que esse requisito é tão alto?
Porque o impacto de uma queda gera forças muito maiores do que o peso do trabalhador, especialmente em cenários com:
- Fator de Queda maior
- Trava-quedas com atraso de acionamento
- Estruturas rígidas
- Falhas de dissipação de energia
A resistência garante que o equipamento sobreviva ao pior cenário.
3. Capacidade de deformação controlada: o princípio dos absorvedores de energia
Absorvedores de energia são componentes obrigatórios (exceto em sistemas retráteis)
Eles funcionam diminuindo o pico de força no impacto através de:
- Ruptura progressiva do tecido (costuras programadas “rasgam”)
- Mecanismos de atrito controlado
- Alongamento calculado
Essa deformação absorve parte da energia gerada pela queda, protegendo:
- O corpo
- A estrutura
- O próprio EPI
Por que isso é vital?
Sem absorvedor de energia, mesmo um talabarte de fita pode gerar forças superiores a 12–15 kN, o que é considerado letal ou causador de lesões graves.
Com um absorvedor, a força geralmente fica abaixo de 6 kN, dentro do limite fisiologicamente seguro.
4. Rigidez do sistema: quanto mais rígido, maior a força transmitida
Componentes rígidos (cabos de aço, barras metálicas, trilhos rígidos e ancoragens metálicas sem flexibilidade) não absorvem energia. Eles transmitem praticamente toda a força da queda diretamente ao corpo.
Esse comportamento é bem documentado na NBR 16325-2 (sistemas de ancoragem), que exige cálculo de:
- Flecha do cabo (no caso de linhas horizontais flexíveis)
- Limite de força permitida
- Deslocamento dinâmico
- Compatibilidade do sistema
Sistemas rígidos são seguros, mas exigem engenharia mais precisa, especialmente para:
- Calcular a Distância Livre de Queda (DCF)
- Definir o posicionamento do ponto de ancoragem
- Selecionar talabarte + absorvedor adequados
- Garantir que a estrutura resista ao pico de impacto
5. Compatibilidade entre dispositivos: o conceito de Sistema Integrado
A NBR 16325-1 e 16325-2 reforça um dos princípios mais importantes: Um sistema de proteção contra quedas só é seguro quando seus componentes são compatíveis entre si.
Isso significa que não basta que:
- O talabarte seja certificado
- O trava-quedas seja certificado
- O cinturão seja certificado
- A ancoragem seja certificada
Se não houver compatibilidade entre todos, o sistema pode falhar mesmo que cada peça individual seja “perfeita”.
Exemplos de incompatibilidade comuns:
- Trava-quedas incompatível com o diâmetro do cabo
- Talabarte inadequado para o método de ancoragem
- Absorvedor insuficiente para massa real do trabalhador
- Mosquetões que geram carga cruzada
- Ancoragem rígida usada com talabarte sem absorvedor
Por isso, normas exigem:
- Projeto integrado
- ART (quando aplicável)
- Ensaios de sistema completo
- Verificação do fabricante
- Revisão da estrutura onde será instalado
O sistema deve ser entendido como uma cadeia, onde cada elo depende do outro.
Se um elo falhar → a queda não é contida corretamente.
4. Altura da Queda: Energia acumulada e exigência de dissipação
A altura da queda determina quanta energia cinética será acumulada antes da retenção.
Quanto maior a altura, maior o impacto.
Normas como a NBR 16325-2 e os cálculos de DCF deixam isso explícito:
A energia gerada na queda deve ser completamente dissipável pelo sistema, sem exceder limites de força e sem permitir contato com o solo ou obstáculos.
Fatores diretamente relacionados à altura:
- Distância livre de queda
- Altura da ancoragem
- Fator de queda
- Comprimento do talabarte
- Flecha de linhas de vida horizontais
- Estiramento do absorvedor de energia
A soma desses elementos é o que determina se o trabalhador será retido com segurança ou se atingirá o solo.
É por isso que a engenharia deve prever:
- Geometria do local
- Tipos de estruturas
- Altura útil disponível
- Obstáculos no caminho
- Sistema mais adequado para o cenário (linha de vida, retrátil, retenção etc.)
Conclusão: Entender a força é dominar a segurança em altura
Nenhum sistema de proteção é eficaz se não for dimensionado considerando:
- Massa
- Fator de queda
- Material
- Altura da queda
Esses são os pilares físicos e normativos que definem a segurança real de um trabalhador.
Compreendê-los é o primeiro passo para um PPCQ bem estruturado e para uma operação realmente segura.
A Atlas Safe garante sistemas projetados para reduzir a força e preservar vidas
A Atlas Safe trabalha com: Engenharia de linhas de vida (NR 35 e NBR 16325), Cálculo de DCF e impacto, Linhas de Vida para trabalho em altura, Projetos técnicos por profissional habilitado e seleção de EPIs compatíveis e certificados

